quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A CARECA DO MEU PAI

A careca do meu pai



Meu pai tem um medo danado de chuva.
Ele disfarça, conta uma piadinha pela metade, e logo ali vai fugindo, procurando uma marquise, uma árvore, algum abrigo.
Eu o conheço bem, muito bem.
É que ele não tem cabelo. A chuva pega gelada no cocão e faz ligação direta com a alma. Direto. Meu pai não é espírita mas acredita numas coisas nada palpáveis.
Se alguém o chama de careca, faz careta, cerra e encerra a brincadeira de mau gosto. Ele prefere que digam que ele não tem cabelo, o que não é necessariamente a mesma coisa.
Um dia, no trânsito, o cara gritou:
- Ô careca F.D.P!
Bah, ele ficou fulo. Olhou pro lado e respondeu:
- Só se eu fosse a tua mãe!
Meu pai é violento de vez em quando. A gente tenta mas não entende estas atitudes. Ele nos ensina a ser da paz, ter calma nos momentos de conflito e aflição. E ainda diz:
- Façam o que eu falo e não façam o que eu faço.
Engraçado.
E agora meu pai está atravessando a avenida, olha pro céu e percebe os primeiros pingos. Aí, pingos direto na carequinha. Vai correr, isso vai. Mas disfarça, vê se tem mais alguém por perto preocupado com os parcos pingos. Ninguém.
Sinal fechado, faixa de segurança, corre o meu papai segurando as moedas no bolso. Vai direto refugiar-se na parada de ônibus.
Enquanto a chuva não passa, vai criando coragem pra encarar a vida.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Ela Saiu

Ela saiu do apartamento numa terça-feira à tarde. Pensei,  já vai aproveitar a quarta e dar um rolé com as amiguinhas. Me deixou como se dei...