quarta-feira, 4 de junho de 2014

Meu Pai e o Chá de Macela

Meu Pai e o Chá de Macela


Meu pai seria Secretário se... Meu pai foi convidado para trabalhar no cargo de Secretário da Secretaria de Bem Estar Social da Prefeitura. A notícia trouxe alívio e felicidade lá em casa. Que alegria! Que orgulho! E a volta do crédito no açougue era dada com certa por todos. Minha mãe lhe disse que finalmente seus predicativos funcionais como funcionário público de carreira tinham sido reconhecidos pela corte eleita recentemente.
Para a posse, comprou um terno cinza escuro no brechó da dona Almerinda, mandou pendurar até o dia trinta. Meu pai, por natureza de mistérios congênitos, é um sujeito desengonçado, descoordenado motoramente, e eu, piá,  mesmo nada entendendo de estilo de roupas, ponho fé que dona Almerinda lhe vendeu um terno dois números maiores do que o dele. Ficou estranho, elefante. Mamãe até tentou convencê-lo de que o defunto era maior, mas não teve jeito, na frente do espelho ele dizia que o paletó lhe dava imponência e suscitava respeito alheio, vá lá decifrar o que o futuro secretário queria dizer.
Acontece que meu pai não durou nem o tempo da nomeação, nem o tempo de mostrar o nome impresso no diário da prefeitura ao Telles, agiota voraz e carniceiro. Meu pai não durou nem até a confecção do carimbo de Secretário. E foi assim:
Chegando segunda-feira, sentou-se à mesa de jacarandá e convocou os subordinados para a primeira reunião de equipe. Dentre vários assuntos tratados, elegeu como prioridade o problema dos mendigos e desocupados que, segundo a opinião pública, incomodavam a população, seja sujando a cidade, seja promovendo arruaças, bebedeiras, badernas, barulhos. Findada a reunião discou para a primeira ferragem da lista telefônica e encomendou cinco mil metros de corda, das grossas e resistentes. Branca, tinha que ser branca.
Quando a transportadora despachou no almoxarifado o rolo de cordas, logo o encarregado chamou o secretário para retirar a compra. E foi logo perguntando para que a autoridade precisava daquilo.
- Vou mandar entregar dois metros para cada mendigo e vagabundo da cidade.
- Mas pra quê, vossa excelência?
- Para que se enforquem, ora!
Papai naquele mesmo dia foi desconstituído do cargo, por bilhete escrito a mão, e readaptado para a secretaria de limpeza urbana. Vazou rapidamente para o prefeito seu projeto-mater de acabar com os mendigos e vadios da cidade pelo enforcamento voluntário.
Em casa, meu pai mereceu tratos de doente, a base de chá de macela, que era o que tínhamos de remédio. E tudo sem alardes, como convinha a ocasião.
Dona Almerinda não aceitou o terno de volta e o dia trinta se aproximava com uma velocidade impressionante.



Ela Saiu

Ela saiu do apartamento numa terça-feira à tarde. Pensei,  já vai aproveitar a quarta e dar um rolé com as amiguinhas. Me deixou como se dei...