Bonifácio – A Praça
Bonifácio acomodou-se com parcimônia junto à platibanda do terraço. O edifício possuía sólidos seis andares. Apontou o rifle para a praça que, naquele sábado mormacento, estava cheia de alvos. A babá com os gêmeos, e de olho no office-boy que lanchava esparramado no banco azul; o vovô lendo as mesmices do matutino jornal e a sentir as pedras nos rins que lhe infernizavam; os meninos correndo na disputa da bola com irascível maldade; os namoradinhos e seus beijos demorados, os seus desejos insaciáveis. Tudo vivo e vivendo, e acontecendo, todo mundo pensando em alguma coisa. E Bonifácio também, cego à dor alheia, às contas vencidas, aos ônibus perdidos, aos papéis jogados por acaso no lixo, aos cartões esquecidos nos telefones públicos. Dali, fácil! Era só escolher quem o atirador levaria desta para o patamar celeste.
- Em quantas vezes dá para fazer?
- Duas.
- E a vista?
- Mesmo preço.
- E a garantia?
- Sete dias, depois é com o fabricante.
- Quanta canalice, né, seu!
O dedo no gatilho e o olho na caça. Bonifácio escolheu a placa de advertência que indicava mão dupla. Pléin! Na mosca. Muita gente, muita opção, pensou. Sábado não era dia de luxúrias. À noite pegaria um cineminha com Isaura: “Canção na Fonte da Piazza”, depois comeriam uma pizza na Dona Bella.