quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Um Canetaço





Um Canetaço

Meu pai é super estranho.
Todo mundo falou que o Jatobazinho jogou demais. Meus colegas na escola só falavam na grande partida do jogador de futebol. Até a professora, que não era muito destes assuntos, disse que o cara jogou um bolão. Disse assim mesmo:
- O cara jogou um bolão!
A gente podia rebater a professora dizendo que quem tem cara é cavalo, boi, bezerro. Mas na escola somos educados, quase todos, menos uns, menos outros.
E meu pai lá, sem se entusiasmar muito com a partida excepcional do atleta.
- Pai, foram três gols. Três golaços!
-Também achei, só acho que se faz muito estardalhaço na imprensa e endeusam o rapaz, e aí a gente esquece do resto.
- Que resto, pai?
Não me disse, mas vi papai falando pra mamãe:
- Um técnico do governo dá um canetaço numa licitação que garante a merenda mais barata pras escolas, beneficia milhares de crianças e não sai uma mísera notinha na imprensa.
Não entendi nada e continuo achando papai muito estranho. Acho que ele tem tido pouco para fazer. É bom quando está no trabalho, porque em casa é um general. Mesmo assim, sempre o escuto dizer pra mamãe que se considera um inútil na repartição. Um zero.
Jatobazinho jogou um bolão, papai não acha e mamãe nem opina, fica cortando couve bem fininha. Será que ela o compreende melhor? Certamente, certamente.
Vou pedir vinte pilas pro papai, tenho que comprar uma camiseta nova, não vou mais aborrecê-lo com o jogador. Mas que ele jogou muito, ah, isso jogou.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A CARECA DO MEU PAI

A careca do meu pai



Meu pai tem um medo danado de chuva.
Ele disfarça, conta uma piadinha pela metade, e logo ali vai fugindo, procurando uma marquise, uma árvore, algum abrigo.
Eu o conheço bem, muito bem.
É que ele não tem cabelo. A chuva pega gelada no cocão e faz ligação direta com a alma. Direto. Meu pai não é espírita mas acredita numas coisas nada palpáveis.
Se alguém o chama de careca, faz careta, cerra e encerra a brincadeira de mau gosto. Ele prefere que digam que ele não tem cabelo, o que não é necessariamente a mesma coisa.
Um dia, no trânsito, o cara gritou:
- Ô careca F.D.P!
Bah, ele ficou fulo. Olhou pro lado e respondeu:
- Só se eu fosse a tua mãe!
Meu pai é violento de vez em quando. A gente tenta mas não entende estas atitudes. Ele nos ensina a ser da paz, ter calma nos momentos de conflito e aflição. E ainda diz:
- Façam o que eu falo e não façam o que eu faço.
Engraçado.
E agora meu pai está atravessando a avenida, olha pro céu e percebe os primeiros pingos. Aí, pingos direto na carequinha. Vai correr, isso vai. Mas disfarça, vê se tem mais alguém por perto preocupado com os parcos pingos. Ninguém.
Sinal fechado, faixa de segurança, corre o meu papai segurando as moedas no bolso. Vai direto refugiar-se na parada de ônibus.
Enquanto a chuva não passa, vai criando coragem pra encarar a vida.


Ela Saiu

Ela saiu do apartamento numa terça-feira à tarde. Pensei,  já vai aproveitar a quarta e dar um rolé com as amiguinhas. Me deixou como se dei...